sábado, abril 28, 2007

A recomendada coluna de Wianey Carlet


Wianey Carlet
28/04/2007
Inversão
Só os medíocres, insensíveis ou patologicamente teimosos não atualizam suas posições com o desfilar do tempo e o acumular de experiências. Já vivi a minha época de comunista “convicto”. Patrões, argh, não passavam de exploradores do pobre e indefeso trabalhador. Menor não era o meu convencimento de que dirigentes de clubes eram figuras tão detestáveis como desnecessárias. Nunca tinham razão e se tivessem, por circunstâncias especiais, melhor seria ignorar. O futebol, para o meu entender daquela época, era feito apenas pelos profissionais: treinadores e jogadores. Quando fracassavam, a culpa era dos cartolas e suas administrações. O êxito, por outro lado, só se devia aos homens do vestiário. Eles eram, sempre e exclusivamente, os heróis de todas as conquistas.
- O tempo se encarregou de revogar aquelas “convicções”. O atraso e o subdesenvolvimento desnudados com a queda do muro confirmaram a suspeita de que Marx e Lênin, afinal, não estava tão certos. Distinguir bons e maus patrões, ficou claro, era tão importante como separar os trabalhadores de acordo com as suas aptidões e dedicação. E os dirigentes de futebol, havia os apaixonados e abnegados tanto quanto os desonestos e incompetentes. Porém, no caso do futebol, acima de tudo e de todos pairaram sempre os clubes. Estas instituições que, varando décadas, sobreviveram à crises econômicas, institucionais, guerras e toda a sorte de turbulências sociais, perenizando-se pelo amor dos seus seguidores e pela condução dos seus administradores.
- Esclarecidas questões cruciais que, no futebol, não autorizavam dúvidas sobre a precedência do ovo ou da galinha, encontrei-me na maturidade, perplexo diante de inversões de valores impostos por circunstâncias naturais e, até, legais. Durante alguns anos, esbravejou-se contra a “escravidão” a que os jogadores eram submetidos pelos clubes até ser alcançada a “libertação”, que hoje acorrenta os profissionais aos seus agentes e engorda, geometricamente, as suas contas bancárias. Enquanto isso, definham as instituições que, sem objetivos lucrativos, oferecem suas estruturas para a descoberta, aprimoramento, revelação e promoção de meninos que, não fossem os clubes, inscreveriam os seus futuros na miséria e na marginalidade.
- Seja porque o mercado oferece parcas alternativas na oferta de treinadores, porque faltam aptidões e conhecimento por parte dos dirigentes ou ambas as coisas, instalou-se no futebol brasileiro outra extravagante inversão de valores: treinadores atuam com poderes imperiais chegando ao absurdo de desdenhar e, solenemente, ignorar o que pensam, desejam ou cobram os dirigentes. Decidem como bem entendem e, quando é negativo o efeito das suas decisões e rompantes, arrumam as suas malas e vão reinar em outro terreiro. No clube, ficam os compromissos, as dívidas, jogadores indicados pelos “reis” e, freqüentemente, a tarefa de reabilitar o desalento dos seus torcedores.
- O clube foi campeão, mas os méritos não chegam aos gabinetes onde as políticas administrativas, financeiras e gerenciais foram executadas. O clube fracassou, então é para estes gabinetes que são apontados os arcabuzes da cobrança. E lá se vão os treinadores e o seu séqüito de auxiliares. Chegará o dia em que trarão consigo um diretor de futebol.
wianey.carlet@zerohora.com.br

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