terça-feira, julho 07, 2009

Polícia para proteger?

07 de julho de 2009 | N° 16023AlertaVoltar para a edição de hoje

ARTIGOS

Polícia para proteger, por João Batista Costa Saraiva*

Anos atrás, ouvi de um amigo a versão de um fato que teria vivenciado em um parque público, em Paris. Contou que teria avistado um casal, em um ponto remoto do bosque, sob arbustos, distante de tudo e todos, entretido em um idílio amoroso, aparentemente fazendo sexo. Observara, de longe, que próximo ao casal, trás de uma árvore, havia alguém os espiando, um voyeur.

Em dado momento, notou que se aproximava um policial. Ficou na expectativa do que aconteceria. Surpreso, viu o policial aproximar-se do voyeur, fazendo-o se afastar de modo a não perturbar os amantes, seguindo adiante na sua ronda pelo parque. Os amantes sequer perceberam sua presença e o que sucedera.

Ao testemunhar o fato, o narrador da história se quedou estupefato e compreendeu que era Europa, mais do que Europa, era Paris.

Lembrei-me disso ao me perceber em plena Porto Alegre dos gaúchos, na noite de 2 de julho, no Estádio Olímpico.

Polícia para proteger, o que se espera. Polícia para ser respeitada, respeito que se conquista e conserva.

Não sei exatamente qual foi o argumento para se fecharem os portões do estádio. A impressão de quem estava lá dentro é de que havia espaço para muita gente ainda. Agora, a repressão que aconteceu lá fora, a violência, a covardia de homens fardados e armados investindo contra o povo ao qual incumbe proteger e orientar, fez brotar um sentimento de tristeza e desencanto, revolta e injustiça, e somente encontra um adjetivo: inaceitável.

A ideia de que quem não é respeitado tenha que ser temido é o começo do fim. Daí para o ódio e uma sucessão de violência em cascata faz-se somente uma questão de tempo.

Não se constrói uma cultura da paz dessa maneira, induzindo confronto e enfrentamento, intimidando e desafiando a quem incumbe proteger.

Diz-se que Porto Alegre, que se prepara para sediar a Copa, precisa de estádio, fala-se na reforma do Beira-Rio, na Arena do Grêmio. Fala-se no metrô, na Rodovia do Parque, hospitais. Enfim, é listada uma série de providências, sem as quais frustrar-se-á o projeto Copa do Mundo.

Pois que se inclua nas necessidades prioritárias uma polícia melhor treinada e preparada, voltada para proteger a cidadania, consciente do princípio constitucional da proporcionalidade, com noção de medida de suas ações, incutindo confiança e credibilidade. As demonstrações da quinta-feira, dia 2 de julho, foram lastimáveis e não remetem a uma boa perspectiva futura, não havendo correspondência entre discurso e ação, a menos que se revisem as condutas e, para tanto, no mínimo há de existir a humildade de reconhecimento do erro.

*Juiz de Direito

Nenhum comentário: